terça-feira, 13 de maio de 2008

Histórias de Verão


Qual será a magia que faz com que um lugar se torne inesquecível nas nossas lembranças?
A mudança de estação afeta muito menos a gente que a população do hemisfério sul,mas quando os primeiros ventos de primavera sopravam no continente europeu, era sinal de que uma grande mudança de atmosfera e de comportamento estava por vir,fazendo uma verdadeira revolução dentro de mim.
As primeiras saídas pela manhã com um casaquinho leve que logo lá pelo horário do almoço desaparecia da produção, anunciavam com a alegria a chegada de um novo tempo. E os primeiros finais de semana com sol e calor significavam uma viagem de trem até o litoral mais próximo,todos os anos...Em alguns, acontecia em maio,outros em junho..
Minha primeira ida a Castigliocello,lugar eleito para o post de hoje, foi planejada com muito esmero. A cerveja ficava por minha conta. Ia a pé até o supermercado "low cost" perto do aeroporto e comprava várias latinhas de cerveja alemã a 0,39 centavos de euro.Minha amiga Simone ficava por conta de preparar os sanduíches e colocá-los em alguma vasilha segura...Bastavam nossas mochilas,a bolsa térmica e muita alegria,lá íamos nós para a estação de trem desbravar o litoral Tirrenio.
Foi em uma dessas viagens de fim de semana a Castiglioncello que presenciamos uma das cenas mais bizarras de nossas vidas.Um suposto passageiro colocou-se entre um vagão e outro e ali ficou...Nada demais se durante a viagem não o tivéssemos flagrado tirando a roupa e ficando completamente nu...E ele não estava indo pra Castiglioncello,portanto não era uma desculpa pra trocar de roupa e botar a sunga pra curtir a praia.
Ao perceber seu movimento,seguramos firme o guarda-sol.Se fosse preciso,sim,ele viraria uma arma.Chamamos o bilheteiro,mas era tarde...Como se nada fosse,o peladão se vestiu novamente e desceu tranquilamente na estação de Livorno,sumindo na multidão.
O bilheteiro nos avisou que poderíamos fazer uma queixa se quiséssemos,mas um dia inteirinho de praia e sol nos esperava e não queríamos perder sequer um segundo.
Umas duas ou três vezes revi o taradão do trem rondando por duas estações,a de Firenze e a de Pisa.Uma incógnita no meio do povo.
Chegar em Castigliocello era passar por Livorno,admirando do trem, o litoral e surpreendendo-se com um pedaço de estrada que com a velocidade do trem deixava entrever rapidamente uma ponte linda sobre o mar.Eu ficava sempre atenta pra não perder essa parte.
Chegando no nosso pedacinho de praia pública,já que na Itália as praias sao loteadas em zonas que pertencem à estabelecimentos balneários(você tem que pagar para deitar-se num pedacinho de areia),o trabalho era só encontrar um espacinho, estender nossa canga e deitar tranquilamente. Chegar cedo era fundamental.Cada milímetro de praia livre era disputadíssimo. Afinal, quem não queria desfrutar da maravilhosa praia onde diziam que Marcello Mastroiani teria sido dono da casinha amarela do fundo das pedras?
E ali a gente ficava,tentando advinhar como se chamaria o salva vidas bonitão,colocando defeito nos biquinões das gringas e acompanhando cada lance da pelada que a turma disputava religiosamente por volta das 2 da tarde.A galera,liderada pelo Bell do Chiclete com Banana(o cara era igualzinho)era a mesma todo ano.Além, é claro da loira aguada que suspeitávamos ser a namorada do baywatch bonitão.
Tinha mulher de biquini brilhante de lantejoula,onça,zebra e tinha até quem levava farofa.Muita gente levava farofa.Nosso sanduichinho com cerveja era aperitivo perto de macarronadas e tomates com oléo,sal e orégano.
Tantas foram as histórias que contávamos uma pra outra que durante um dia inteiro a gente tinha um resumo completo do que tinha sido a vida da outra até aquele presente momento.Isso acontece quando temos ao lado pessoas especiais em lugares maravilhosos.Paixonites da adolescência,projetos de vida,saudades da família,cremes e tratamentos estéticos inovadores(não pode faltar isso,né?),desilusões,dificuldades,felicidades...cumplicidade.
As areias de Castiglioncello não presenciavam somente gringos branquelos em busca de sol,crianças em seus primeiros mergulhos, mostrando os peixinhos aos pais, nem a vaidade exacerbada de mulheres e homens. Aquele pedacinho de terra, que foi por muitas vezes nosso refúgio e paraíso, foi testemunha de uma amizade forte,onde um sorriso falava tudo e sabia a hora certa de desmontar barraca, ir tomar um sorvete e voltar pra casa, afinal o verão estava apenas começando.

4 comentários:

Beto disse...

Isazinha,
adorei a historia do peladão..hahaha...portal demaaais!:)rs
Pela maneira como você descreve cada cena na praia, dá pra ver direitim o filme se desenrolando, a pelada patrocinada pelo Chiclete com Banana, a criancinha com o balde vermelho cheio de peixes, as gringas branquelas sem bunda, as latas de cerveja vazias na areia :), a canga e o guarda-sol, o mar gelado,... ...só não consegui ver foi a cena do bunitão sem nome de sunga vermelha!!;)
Bjs

Renata Carvalho Rocha Gómez disse...

Adorei o texto mas o que gostei mesmo foi a cerveja alemã a 0,39 centavos de euro ! Ficaria chapada fácil !
O brasil nao esta longe dessa realidade de ter praias particulares onde precisa pagar para sentar na areia. Onde esse mundo vai parar ? Tenha medo.
Tenho que confessar que nunca fui la muito fãs da Italia, acho que deve ser tudo lindo mas tenho outras preferencias, porem lendo seus textos estou realmente afim de conhecer !
Um beijo

Marcela disse...

Conçaaaaaaaaaaa, meu Deus, que história do portaaaaaal :) hahahahaha Adorei, a história, o taradão do trem, a amizade e o comentário bbaldanzi que já adotou a terminologia "portal" heheheh :)
Te amo amiga!!

Anônimo disse...

como disse bbaldanzi..enquanto vc vai contando a storia..da pra ver as imagens...vc tem esse dom..e te garanto ke quando eu fiz o mesmo percurso, tirando o peladao hhehee, as cenas eram estas ke me relembrei agora lendo ... adorei...