Imagem do Google
Hoje me lembrei do velho jogo de malas que ficava na porta de cima do armário. Eram 4 e nós sempre fomos 4. Toda vez que íamos viajar, meus pais tiravam as malas marrons lá do alto e ia saindo uma de dentro da outra, para mim, parecia mágica. Naquela época, eu não tinha autonomia para arrumar minhas próprias coisas, mas fazia questão de colocar alguma boneca deitada em um bolsinho sanfonado de tecido de forro vermelho que tinha dentro da mala. Ali era a caminha dela e ela também ia viajar comigo.
Eu passava o ano inteiro esperando o momento de desempoeirar o jogo de malas e colocá-lo em cima da cama pra sair um pouco o cheiro de guardado. Quando a gente voltava de viagem e ia desfazer a mala, eu sempre escondia alguma coisa lá dentro pra encontrar só no proximo ano, por puro prazer.
Os anos passaram e as minhas coisas já não cabiam mais na malinha pequena. As bolsas de mão e as malas de rodinha pouco a pouco tomaram conta das nossas viagens e o jogo de malas ficou pra sempre esquecido no fundo da porta de cima do armário.
quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009
terça-feira, 17 de fevereiro de 2009
A caminho do trabalho
Foto do Google
Muitas vezes me pego em momentos de pura felicidade. Muitas vezes mesmo. Atravesso a rua em passos lentos, mas firmes e procuro acertar o passeio olhando bem a grama que cresce no buraquinho do asfalto.
De manhã, sinto a temperatura de primavera que tem céu azul mas aquele frescor que te orienta em direção aos seus sentidos.
Olho para um lado, olho para o outro e me vejo passando entre os carros, driblando os motoqueiros e alcançando a praça cheia de árvores e poetas.
Respeito o sinal que me diz: calma, não é o momento de passar e gosto de não ter hora marcada pra chegar.
O cotidiano mostra coisas que você insiste em ignorar. No meu caso, encontro uma força que pulsa e me diz que é hora de seguir. Parece que vejo uma placa a cada esquina indicando que estou no caminho certo.
Muitas vezes me pego em momentos de pura felicidade. Muitas vezes mesmo. Atravesso a rua em passos lentos, mas firmes e procuro acertar o passeio olhando bem a grama que cresce no buraquinho do asfalto.
De manhã, sinto a temperatura de primavera que tem céu azul mas aquele frescor que te orienta em direção aos seus sentidos.
Olho para um lado, olho para o outro e me vejo passando entre os carros, driblando os motoqueiros e alcançando a praça cheia de árvores e poetas.
Respeito o sinal que me diz: calma, não é o momento de passar e gosto de não ter hora marcada pra chegar.
O cotidiano mostra coisas que você insiste em ignorar. No meu caso, encontro uma força que pulsa e me diz que é hora de seguir. Parece que vejo uma placa a cada esquina indicando que estou no caminho certo.
sábado, 14 de fevereiro de 2009
Observando
Foto Google
A Savassi foi invadida por meninos e meninas inquietos. Shortinho e meia preta, camisetas com frases em inglês, tênis allstar, cabelos vermelhos. E dentro dos limites da pracinha, eles passeiam de um lado pro outro,abraçam-se como se tivessem ficado anos sem se ver e jogam muita conversa fora.
O fato é que o comportamento da turma chama atenção na mesa de bar que eu estou e começo a me lembrar da minha inquietude quando tinha a idade deles. Os encontros na pracinha da minha época serviam para as primeiras paqueras, para fumar um cigarrinho escondido e para dar uns beijinhos sem que ninguém descobrisse.
Hoje, os meninos e meninas inquietos fumam e bebem na pracinha sem rodeios e muitos dos casaizinhos não são mais formados por um menino e uma menina e sim por duas garotas que descobriram que se amam e que amor e afinidade independem do sexo.
Olho para o novo sem me dar conta do tempo que passou e percebo que não sou a única a observar. O novo morador das ruas da Savassi, aquele que eu vejo pela manhã admirando as mocinhas das publicidades, também está lá. E ele olha pra tudo aquilo, sentado num banco. Levanta, dá uma volta entre os garotos que nem dão conta de sua presença a não ser pelo cheiro. Não consigo dar uma idade pra ele,mas ele é jovem. Penso na pracinha que ele frequentava quando tinha aquela idade. Penso no que ele está achando daquilo tudo. De como vê o rapaz de coturno, sobretudo e um olho pintado com uma rodela preta, a menina de óculos escuros e o casalzinho de guarda chuva aberto num noite quente sem chuva.
Olho pro mendigo e me olho. Somos todos seres humanos tentando entender quem somos nós, os seres humanos.
A Savassi foi invadida por meninos e meninas inquietos. Shortinho e meia preta, camisetas com frases em inglês, tênis allstar, cabelos vermelhos. E dentro dos limites da pracinha, eles passeiam de um lado pro outro,abraçam-se como se tivessem ficado anos sem se ver e jogam muita conversa fora.
O fato é que o comportamento da turma chama atenção na mesa de bar que eu estou e começo a me lembrar da minha inquietude quando tinha a idade deles. Os encontros na pracinha da minha época serviam para as primeiras paqueras, para fumar um cigarrinho escondido e para dar uns beijinhos sem que ninguém descobrisse.
Hoje, os meninos e meninas inquietos fumam e bebem na pracinha sem rodeios e muitos dos casaizinhos não são mais formados por um menino e uma menina e sim por duas garotas que descobriram que se amam e que amor e afinidade independem do sexo.
Olho para o novo sem me dar conta do tempo que passou e percebo que não sou a única a observar. O novo morador das ruas da Savassi, aquele que eu vejo pela manhã admirando as mocinhas das publicidades, também está lá. E ele olha pra tudo aquilo, sentado num banco. Levanta, dá uma volta entre os garotos que nem dão conta de sua presença a não ser pelo cheiro. Não consigo dar uma idade pra ele,mas ele é jovem. Penso na pracinha que ele frequentava quando tinha aquela idade. Penso no que ele está achando daquilo tudo. De como vê o rapaz de coturno, sobretudo e um olho pintado com uma rodela preta, a menina de óculos escuros e o casalzinho de guarda chuva aberto num noite quente sem chuva.
Olho pro mendigo e me olho. Somos todos seres humanos tentando entender quem somos nós, os seres humanos.
quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009
Amor espanhol
Imagem Picasso do Google
Ilaria amava Barcelona. Não era nenhuma Vicky, muito menos Cristina.
Pensando bem, ela tinha muito de Cristina. Tinha ares de devoradora de homens, mas no fundo era uma doce menina. Talvez fosse só um modo de enfrentar o pai, um policial enfurecido que tomava conta de todos os seus passos.
Ilaria era tão fascinada pela Espanha que se matriculou na faculdade de Letras para poder estudar a língua. E realmente era muito boa, faltava pouco para falar até mesmo catalão.
Com a desculpa de uma semana cultural na capital da Catalunia, Ilaria tirou férias do trabalho, fez suas malas e entrou num avião rumo ao paraíso. Despediu-se do pai, prometendo telefonar diariamente para dizer como estava, o que tinha feito, os museus que tinha visitado.
Chegando em Barcelona, ela foi passear pelas Ramblas e notou a presença de um rapaz magro e alto que não tirava os olhos dela. Era Victor, um representante comercial que fazia o estilo homem sério de oclinhos, terno e gravata.
A semana passou entre visitas ao Parque Guel, passeios pela praia e caminhadas noturnas pelo bairro Gótico. Ilaria sequer teve tempo de telefonar para o pai, que a essa altura se descabelava de preocupação. Chegou para trabalhar na semana seguinte convencida de que havia encontrado o amor.
Em um mês, Victor se mudou para sua cidade. Sem falar uma palavra de italiano que não fosse buon giorno e grazie, ele conseguiu emprego de “garoto de terno que abre e fecha a porta” numa butique granfina. E foi ali que nos conhecemos.
Victor tinha uma particularidade. Era gago. E quando ele abria a boca para tentar pronunciar alguma coisa ou iniciar um discurso, recebia sorrisos incompreensíveis que lá no fundo queriam disparar em gargalhadas.
Já que ninguém fazia nada, eu resolvi comprar um curso prático de espanhol na banca da esquina para tentar aprender sua língua e ser solidária com ele. O primeiro fascículo custava 1 euro. Permaneci no Hola Que Tal para sempre já que os números seguintes passaram a custar o quíntuplo deste valor e eu não achei isso nada justo.
Quando ele ficava nervoso por não conseguir se expressar, era ainda pior. A gagueira subia, ele ficava vermelho e eu queria morrer de dó.
Ele me contava de Barcelona, me contava de como se apaixonou por Ilaria e do quanto queria levá-la consigo quando ela terminasse a faculdade.
Victor permaneceu como "garoto que abre e fecha porta" durante uns 5 meses, o suficiente para desenrolar um pouco a língua e arrumar emprego por outras bandas.
O garoto levou seu currículo na Zara e conseguiu a vaga de vendedor do departamento infantil. Todo mundo teve certeza que a entrevista tinha sido feita em espanhol. Confesso que eu também.
De vez em quando, eu encontrava Victor na rua, em cima de uma bicicletinha branca a caminho do trabalho. Ele me contava da casa nova que tinha alugado com uns garotos, da dificuldade em conquistar o sogro bravo e do quanto amava Ilaria.
Victor viveu na Itália por quase 2 anos. Até que um dia, Ilaria fez as malas de vez, pegou o diploma da universidade, deu adeus ao pai contrariadíssimo e chegou mais uma vez deslumbrante para subir e descer as Ramblas. Agora ela não era mais Ilaria Cristina Barcelona, ela era Ilaria, senhora Victor, a menina capaz de curar a gagueira de um homem que em seus quase 2 metros de altura, guardava a mesma doçura de uma criança.
*Victor adorava a cantora espanhola Bebe. Toda vez que meu Ipod toca Malo, me lembro dele
Ilaria amava Barcelona. Não era nenhuma Vicky, muito menos Cristina.
Pensando bem, ela tinha muito de Cristina. Tinha ares de devoradora de homens, mas no fundo era uma doce menina. Talvez fosse só um modo de enfrentar o pai, um policial enfurecido que tomava conta de todos os seus passos.
Ilaria era tão fascinada pela Espanha que se matriculou na faculdade de Letras para poder estudar a língua. E realmente era muito boa, faltava pouco para falar até mesmo catalão.
Com a desculpa de uma semana cultural na capital da Catalunia, Ilaria tirou férias do trabalho, fez suas malas e entrou num avião rumo ao paraíso. Despediu-se do pai, prometendo telefonar diariamente para dizer como estava, o que tinha feito, os museus que tinha visitado.
Chegando em Barcelona, ela foi passear pelas Ramblas e notou a presença de um rapaz magro e alto que não tirava os olhos dela. Era Victor, um representante comercial que fazia o estilo homem sério de oclinhos, terno e gravata.
A semana passou entre visitas ao Parque Guel, passeios pela praia e caminhadas noturnas pelo bairro Gótico. Ilaria sequer teve tempo de telefonar para o pai, que a essa altura se descabelava de preocupação. Chegou para trabalhar na semana seguinte convencida de que havia encontrado o amor.
Em um mês, Victor se mudou para sua cidade. Sem falar uma palavra de italiano que não fosse buon giorno e grazie, ele conseguiu emprego de “garoto de terno que abre e fecha a porta” numa butique granfina. E foi ali que nos conhecemos.
Victor tinha uma particularidade. Era gago. E quando ele abria a boca para tentar pronunciar alguma coisa ou iniciar um discurso, recebia sorrisos incompreensíveis que lá no fundo queriam disparar em gargalhadas.
Já que ninguém fazia nada, eu resolvi comprar um curso prático de espanhol na banca da esquina para tentar aprender sua língua e ser solidária com ele. O primeiro fascículo custava 1 euro. Permaneci no Hola Que Tal para sempre já que os números seguintes passaram a custar o quíntuplo deste valor e eu não achei isso nada justo.
Quando ele ficava nervoso por não conseguir se expressar, era ainda pior. A gagueira subia, ele ficava vermelho e eu queria morrer de dó.
Ele me contava de Barcelona, me contava de como se apaixonou por Ilaria e do quanto queria levá-la consigo quando ela terminasse a faculdade.
Victor permaneceu como "garoto que abre e fecha porta" durante uns 5 meses, o suficiente para desenrolar um pouco a língua e arrumar emprego por outras bandas.
O garoto levou seu currículo na Zara e conseguiu a vaga de vendedor do departamento infantil. Todo mundo teve certeza que a entrevista tinha sido feita em espanhol. Confesso que eu também.
De vez em quando, eu encontrava Victor na rua, em cima de uma bicicletinha branca a caminho do trabalho. Ele me contava da casa nova que tinha alugado com uns garotos, da dificuldade em conquistar o sogro bravo e do quanto amava Ilaria.
Victor viveu na Itália por quase 2 anos. Até que um dia, Ilaria fez as malas de vez, pegou o diploma da universidade, deu adeus ao pai contrariadíssimo e chegou mais uma vez deslumbrante para subir e descer as Ramblas. Agora ela não era mais Ilaria Cristina Barcelona, ela era Ilaria, senhora Victor, a menina capaz de curar a gagueira de um homem que em seus quase 2 metros de altura, guardava a mesma doçura de uma criança.
*Victor adorava a cantora espanhola Bebe. Toda vez que meu Ipod toca Malo, me lembro dele
terça-feira, 10 de fevereiro de 2009
Adeus Eluana,adeus Mentana
Foto Google
E se um cidadão comum há 17 anos no estado vegetativo levantasse a polêmica da eutanásia no Brasil, a Globo deixaria de colocar no ar o Big Brother?
Pois foi o que (não)aconteceu na Itália, enquanto Eluana Englaro finalmente descansava de sua infindável angústia na noite de hoje.
Minha amada terra da polêmica preferiu discutir quem dos candidatos ao paredão sairia da casa a ter de enfrentar um debate que dividia governo e presidente, a igreja e a opinião pública.
Mais fácil deixar a polonesa gostosa dançar em frente das câmeras ou o moreno mediterrâneo disparar qualquer bobagem em um italiano tosco e incorreto.
Enrico Mentana, um dos jornalistas mais respeitados da TV italiana, anunciou que a propósito deste acontecimento deixa a Mediaset (uma das redes de TV de Berlusconi). O apresentador, que devia falar sobre o caso no lugar da transmissão do Grande Fratello(Big Brother) alegou falta de coerência, defendendo uma televisão mais informativa e menos apelativa.
Acabou o drama de Eluana, a tristeza de seus médicos, a angústia de sua família. Seria inútil discutir uma situação sacramentada, finalizada, mas acredito que mais inútil ainda seria colocar no ar cenas de uma casa onde vegetam cérebros que ainda estão vivos.
E se um cidadão comum há 17 anos no estado vegetativo levantasse a polêmica da eutanásia no Brasil, a Globo deixaria de colocar no ar o Big Brother?
Pois foi o que (não)aconteceu na Itália, enquanto Eluana Englaro finalmente descansava de sua infindável angústia na noite de hoje.
Minha amada terra da polêmica preferiu discutir quem dos candidatos ao paredão sairia da casa a ter de enfrentar um debate que dividia governo e presidente, a igreja e a opinião pública.
Mais fácil deixar a polonesa gostosa dançar em frente das câmeras ou o moreno mediterrâneo disparar qualquer bobagem em um italiano tosco e incorreto.
Enrico Mentana, um dos jornalistas mais respeitados da TV italiana, anunciou que a propósito deste acontecimento deixa a Mediaset (uma das redes de TV de Berlusconi). O apresentador, que devia falar sobre o caso no lugar da transmissão do Grande Fratello(Big Brother) alegou falta de coerência, defendendo uma televisão mais informativa e menos apelativa.
Acabou o drama de Eluana, a tristeza de seus médicos, a angústia de sua família. Seria inútil discutir uma situação sacramentada, finalizada, mas acredito que mais inútil ainda seria colocar no ar cenas de uma casa onde vegetam cérebros que ainda estão vivos.
domingo, 8 de fevereiro de 2009
Algumas verdades
Fotos de Isabela e Beto
Essa semana, ouvi de uma pessoa que a Índia pra ela, não é nada além que pura ignorância.
Pensei que um elefante caminhando na minha frente,ou um rato passeando pelo meu quarto me incomodam muito menos que as rodas de pseudointelectuais no café da livraria ou no restaurante do museu.
Imaginei que o cheiro de xixi misturado ao perfume das especiarias me embrulhava menos o estômago que o perfume francês e os quilos de maquiagem da moça do elevador.
Lembrei que tirar os sapatos e entrar dentro de um templo descalça pra mim foi muito mais prazeroso do que experimentar o sapato da vitrine da loja.
Senti que o sorriso gratuito e sincero pelas ruas da Índia era muito mais honesto do que tantos que eu ando recebendo por aqui.
Lembrei que as estações de trem, com o chão repleto de gente dormindo encolhida, eram mais aconchegantes e menos frias que a sala de espera de um consultório médico.
Lembrei que a curiosidade pura e inocente dos indianos era muito menos agressiva daquela das pessoas que fingem te dar conselhos.
Preferi milhões de vezes sentar no chão, comer com a mão e dividir meu alimento com alguma baratinha do que enfrentar a fila pro restaurante granfino, escutando conversas sobre a vida de quem eu nem conheço.
Vi que o abraço dos homens pelas ruas da Índia eram mais significativos que o aperto de mão entre os senhores engravatados.
Tive vontade de responder à pessoa que reduziu a tradução da Índia na palavra ignorância, mas achei melhor me fechar eu mesma na minha ignorância.
Hoje decidi: quero ser a mais ignorante de todos os seres humanos.
Essa semana, ouvi de uma pessoa que a Índia pra ela, não é nada além que pura ignorância.
Pensei que um elefante caminhando na minha frente,ou um rato passeando pelo meu quarto me incomodam muito menos que as rodas de pseudointelectuais no café da livraria ou no restaurante do museu.
Imaginei que o cheiro de xixi misturado ao perfume das especiarias me embrulhava menos o estômago que o perfume francês e os quilos de maquiagem da moça do elevador.
Lembrei que tirar os sapatos e entrar dentro de um templo descalça pra mim foi muito mais prazeroso do que experimentar o sapato da vitrine da loja.
Senti que o sorriso gratuito e sincero pelas ruas da Índia era muito mais honesto do que tantos que eu ando recebendo por aqui.
Lembrei que as estações de trem, com o chão repleto de gente dormindo encolhida, eram mais aconchegantes e menos frias que a sala de espera de um consultório médico.
Lembrei que a curiosidade pura e inocente dos indianos era muito menos agressiva daquela das pessoas que fingem te dar conselhos.
Preferi milhões de vezes sentar no chão, comer com a mão e dividir meu alimento com alguma baratinha do que enfrentar a fila pro restaurante granfino, escutando conversas sobre a vida de quem eu nem conheço.
Vi que o abraço dos homens pelas ruas da Índia eram mais significativos que o aperto de mão entre os senhores engravatados.
Tive vontade de responder à pessoa que reduziu a tradução da Índia na palavra ignorância, mas achei melhor me fechar eu mesma na minha ignorância.
Hoje decidi: quero ser a mais ignorante de todos os seres humanos.
quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009
Um palco para Tinoco
Foto da Revista Brasileiros
Quem não se lembra do Tinoco, que junto do irmão Tonico cantava as canções que a gente escutava no final de semana na roça? Quem não se lembra da triste história do Chico Mineiro contada nos versos dos dois caipiras?
Há alguns meses, eu li uma reportagem do Ricardo Kotscho para a revista Brasileiros sobre o rumo que a vida do Tinoco tinha tomado sem o irmão Tonico, que morreu em 94.
Da aposentadoria de mil reais que ele ganhava, dos 2,5 mil reais que ele tirava de cachê em shows nos sorteios da loteria e do dinheirinho que ele recebia em apresentações simples em casamentos, batizados e eventos por esse Brasil afora. Na minha cabeça, eu ficava imaginando um senhorzinho de idade, chegando num galpão humilde, numa churrascaria pra cantar com nostalgia as modas de viola que o tempo deixou pra trás na memória do povo.
Me lembro de ver as fotos na revista, de um Tinoco de blazer amarelo ovo, cabelos brancos na altura dos ombros, segurando um microfone com alegria, fazendo aquilo que fez pela vida inteira por prazer e que hoje é mais que uma necessidade.
Tinoco é só mais um daqueles artistas que tiveram seu auge, que da origem humilde subiram aos palcos, viram multidões nas festas de rodeio, nos estúdios de televisão e que hoje, passam seus dias no quase esquecimento, tentando reunir as forças que restam para tocar a vida.
Tinoco é um grande artista popular, disso ninguém tem dúvida. Tinoco é história, é cultura, é patrimônio. E hoje eu soube que Tinoco tem que rifar seu carro, o veículo que o leva para fazer os pequenos shows, pra pagar o tratamento de câncer da mulher. É que a música nao cura, a poesia não é remédio, a moda de viola não faz passar a dor. A vida é frágil e imprevisível, assim como a inesquecível história do Chico Mineiro.
Quem não se lembra do Tinoco, que junto do irmão Tonico cantava as canções que a gente escutava no final de semana na roça? Quem não se lembra da triste história do Chico Mineiro contada nos versos dos dois caipiras?
Há alguns meses, eu li uma reportagem do Ricardo Kotscho para a revista Brasileiros sobre o rumo que a vida do Tinoco tinha tomado sem o irmão Tonico, que morreu em 94.
Da aposentadoria de mil reais que ele ganhava, dos 2,5 mil reais que ele tirava de cachê em shows nos sorteios da loteria e do dinheirinho que ele recebia em apresentações simples em casamentos, batizados e eventos por esse Brasil afora. Na minha cabeça, eu ficava imaginando um senhorzinho de idade, chegando num galpão humilde, numa churrascaria pra cantar com nostalgia as modas de viola que o tempo deixou pra trás na memória do povo.
Me lembro de ver as fotos na revista, de um Tinoco de blazer amarelo ovo, cabelos brancos na altura dos ombros, segurando um microfone com alegria, fazendo aquilo que fez pela vida inteira por prazer e que hoje é mais que uma necessidade.
Tinoco é só mais um daqueles artistas que tiveram seu auge, que da origem humilde subiram aos palcos, viram multidões nas festas de rodeio, nos estúdios de televisão e que hoje, passam seus dias no quase esquecimento, tentando reunir as forças que restam para tocar a vida.
Tinoco é um grande artista popular, disso ninguém tem dúvida. Tinoco é história, é cultura, é patrimônio. E hoje eu soube que Tinoco tem que rifar seu carro, o veículo que o leva para fazer os pequenos shows, pra pagar o tratamento de câncer da mulher. É que a música nao cura, a poesia não é remédio, a moda de viola não faz passar a dor. A vida é frágil e imprevisível, assim como a inesquecível história do Chico Mineiro.
Um anjo no céu
Foto pelo Google
Quando a gente era pequena, maio era o mês de vestir de anjo para coroar Nossa Senhora. Acho que eu nunca entendi o sentido daquilo. Pra mim, significava sair da escola e ir direto para igreja pegar em um papelzinho escrito à mão, o refrão da música e o texto que me cabia, que dependia do presente que eu daria à Nossa Senhora.
Podia ser o terço, a palma, o véu, as flores ou o mais importante, a coroa, que era super disputada pelas anjinhas.
Todas às tardes, depois da aula, a gente ia pra igreja ensaiar,acompanhadas das nossas mães. Enquanto isso,durante a semana, elas conferiam se as pomposas asinhas de pena de ganso dos anos anteriores ainda estavam intactas.O mais divertido,porém era ir nas distribuidoras de balas e doces escolher as guloseimas das surpresinhas. Quando terminava a coroação, a gente corria pro salão da igreja pra pegar a sacolinha de doces feita pelas mães das anjinhas que tinham feito a coroação. Algumas vezes, a gente saía satisfeita, outras um pouco decepcionadas. Me lembro que ao passar de cada ano, as surpresinhas iam minguando pouco a pouco.
No altar da igreja, existiam duas janelinhas, uma à esquerda e outra à direita. Elas se abriam e de lá,saíam dois anjinhos. Pra mim, era uma passagem secreta e eu morria de inveja dos anjinhos que entravam ali.
Um dia, muito tímida, eu pedi à senhora da coroação pra ser a anjinha da janela. Eu morria de medo de cair escada abaixo,tropeçando naquele vestidão comprido com aquelas sapatinhas brancas escorregadias.
Ela deixou e, pela primeira vez,eu percorri a passagem secreta.Que emoção!Abri a janelinha e lá de cima vi a igreja inteirinha olhando para aquele anjinho que estava ainda mais perto do céu.Não era meu dia de coroar, por isso nem me passou pela cabeça o medo de esquecer a fala,a música.
Fiquei ali, de mãozinha posta olhando as pessoas e imaginando qual seria a surpresinha daquela noite.
*ainda tenho minhas fotos de anjinha,um dia coloco aqui
Quando a gente era pequena, maio era o mês de vestir de anjo para coroar Nossa Senhora. Acho que eu nunca entendi o sentido daquilo. Pra mim, significava sair da escola e ir direto para igreja pegar em um papelzinho escrito à mão, o refrão da música e o texto que me cabia, que dependia do presente que eu daria à Nossa Senhora.
Podia ser o terço, a palma, o véu, as flores ou o mais importante, a coroa, que era super disputada pelas anjinhas.
Todas às tardes, depois da aula, a gente ia pra igreja ensaiar,acompanhadas das nossas mães. Enquanto isso,durante a semana, elas conferiam se as pomposas asinhas de pena de ganso dos anos anteriores ainda estavam intactas.O mais divertido,porém era ir nas distribuidoras de balas e doces escolher as guloseimas das surpresinhas. Quando terminava a coroação, a gente corria pro salão da igreja pra pegar a sacolinha de doces feita pelas mães das anjinhas que tinham feito a coroação. Algumas vezes, a gente saía satisfeita, outras um pouco decepcionadas. Me lembro que ao passar de cada ano, as surpresinhas iam minguando pouco a pouco.
No altar da igreja, existiam duas janelinhas, uma à esquerda e outra à direita. Elas se abriam e de lá,saíam dois anjinhos. Pra mim, era uma passagem secreta e eu morria de inveja dos anjinhos que entravam ali.
Um dia, muito tímida, eu pedi à senhora da coroação pra ser a anjinha da janela. Eu morria de medo de cair escada abaixo,tropeçando naquele vestidão comprido com aquelas sapatinhas brancas escorregadias.
Ela deixou e, pela primeira vez,eu percorri a passagem secreta.Que emoção!Abri a janelinha e lá de cima vi a igreja inteirinha olhando para aquele anjinho que estava ainda mais perto do céu.Não era meu dia de coroar, por isso nem me passou pela cabeça o medo de esquecer a fala,a música.
Fiquei ali, de mãozinha posta olhando as pessoas e imaginando qual seria a surpresinha daquela noite.
*ainda tenho minhas fotos de anjinha,um dia coloco aqui
segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009
Como uma Miragem
Foto por Isabela
Ele não sabia falar inglês.Bastou um gesto e um sorriso sem graça pra gente entender que o que ele queria era que a gente tirasse uma foto da esposa e do bebê diante do imponente Taj Mahal. Nos passou uma velha câmera daquelas que a gente aperta o botão e gira pro filme rodar. Eu aproveitei e saquei a minha pra registrar o momento do flash. De longe, o pai tentava chamar a atenção do bebê para que ele olhasse pra câmera, enquanto a fila aumentava de russos,japoneses e americanos querendo fazer pose em frente ao Taj.
A mulher ajeitou o sári verde de seda,segurou firme o bebê e olhou pra gente,enquanto sutilmente o Taj mudava de cor com o dia amanhecendo. A neblina que cobria a base, fazendo com que ele parecesse uma miragem, já tinha sumido e a minha vontade era de que aquele momento jamais acabasse.
Vi aquele instante imortalizado na casa de uma família indiana, bem em cima de um móvel velho, guardando junto com o pó,a lembrança de um dia de inverno em Agra,num monumento dos sonhos. Uma das imagens mais lindas e significativas que eu jamais esquecerei... por toda minha vida.
Ele não sabia falar inglês.Bastou um gesto e um sorriso sem graça pra gente entender que o que ele queria era que a gente tirasse uma foto da esposa e do bebê diante do imponente Taj Mahal. Nos passou uma velha câmera daquelas que a gente aperta o botão e gira pro filme rodar. Eu aproveitei e saquei a minha pra registrar o momento do flash. De longe, o pai tentava chamar a atenção do bebê para que ele olhasse pra câmera, enquanto a fila aumentava de russos,japoneses e americanos querendo fazer pose em frente ao Taj.
A mulher ajeitou o sári verde de seda,segurou firme o bebê e olhou pra gente,enquanto sutilmente o Taj mudava de cor com o dia amanhecendo. A neblina que cobria a base, fazendo com que ele parecesse uma miragem, já tinha sumido e a minha vontade era de que aquele momento jamais acabasse.
Vi aquele instante imortalizado na casa de uma família indiana, bem em cima de um móvel velho, guardando junto com o pó,a lembrança de um dia de inverno em Agra,num monumento dos sonhos. Uma das imagens mais lindas e significativas que eu jamais esquecerei... por toda minha vida.
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