Imagem Picasso do Google
Ilaria amava Barcelona. Não era nenhuma Vicky, muito menos Cristina.
Pensando bem, ela tinha muito de Cristina. Tinha ares de devoradora de homens, mas no fundo era uma doce menina. Talvez fosse só um modo de enfrentar o pai, um policial enfurecido que tomava conta de todos os seus passos.
Ilaria era tão fascinada pela Espanha que se matriculou na faculdade de Letras para poder estudar a língua. E realmente era muito boa, faltava pouco para falar até mesmo catalão.
Com a desculpa de uma semana cultural na capital da Catalunia, Ilaria tirou férias do trabalho, fez suas malas e entrou num avião rumo ao paraíso. Despediu-se do pai, prometendo telefonar diariamente para dizer como estava, o que tinha feito, os museus que tinha visitado.
Chegando em Barcelona, ela foi passear pelas Ramblas e notou a presença de um rapaz magro e alto que não tirava os olhos dela. Era Victor, um representante comercial que fazia o estilo homem sério de oclinhos, terno e gravata.
A semana passou entre visitas ao Parque Guel, passeios pela praia e caminhadas noturnas pelo bairro Gótico. Ilaria sequer teve tempo de telefonar para o pai, que a essa altura se descabelava de preocupação. Chegou para trabalhar na semana seguinte convencida de que havia encontrado o amor.
Em um mês, Victor se mudou para sua cidade. Sem falar uma palavra de italiano que não fosse buon giorno e grazie, ele conseguiu emprego de “garoto de terno que abre e fecha a porta” numa butique granfina. E foi ali que nos conhecemos.
Victor tinha uma particularidade. Era gago. E quando ele abria a boca para tentar pronunciar alguma coisa ou iniciar um discurso, recebia sorrisos incompreensíveis que lá no fundo queriam disparar em gargalhadas.
Já que ninguém fazia nada, eu resolvi comprar um curso prático de espanhol na banca da esquina para tentar aprender sua língua e ser solidária com ele. O primeiro fascículo custava 1 euro. Permaneci no Hola Que Tal para sempre já que os números seguintes passaram a custar o quíntuplo deste valor e eu não achei isso nada justo.
Quando ele ficava nervoso por não conseguir se expressar, era ainda pior. A gagueira subia, ele ficava vermelho e eu queria morrer de dó.
Ele me contava de Barcelona, me contava de como se apaixonou por Ilaria e do quanto queria levá-la consigo quando ela terminasse a faculdade.
Victor permaneceu como "garoto que abre e fecha porta" durante uns 5 meses, o suficiente para desenrolar um pouco a língua e arrumar emprego por outras bandas.
O garoto levou seu currículo na Zara e conseguiu a vaga de vendedor do departamento infantil. Todo mundo teve certeza que a entrevista tinha sido feita em espanhol. Confesso que eu também.
De vez em quando, eu encontrava Victor na rua, em cima de uma bicicletinha branca a caminho do trabalho. Ele me contava da casa nova que tinha alugado com uns garotos, da dificuldade em conquistar o sogro bravo e do quanto amava Ilaria.
Victor viveu na Itália por quase 2 anos. Até que um dia, Ilaria fez as malas de vez, pegou o diploma da universidade, deu adeus ao pai contrariadíssimo e chegou mais uma vez deslumbrante para subir e descer as Ramblas. Agora ela não era mais Ilaria Cristina Barcelona, ela era Ilaria, senhora Victor, a menina capaz de curar a gagueira de um homem que em seus quase 2 metros de altura, guardava a mesma doçura de uma criança.
*Victor adorava a cantora espanhola Bebe. Toda vez que meu Ipod toca Malo, me lembro dele
quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009
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